quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Nossos próprios paparazzi

Antigamente: sentia uma dorzinha na garganta. Puxa, que droga. A dor piorava. Ia ao médico. Ficava uns dias mal, faltava no trabalho um dia, dava uma choramingada pra mãe e/ou namorado(a). Tomava mel com propólis, fazia uns gargarejos, melhorava, passava, a vida seguia.

Atualmente: sente uma dorzinha na garganta. Posta no Facebook e no Twitter: "garganta doendo, acho que vou ficar doente. #quebosta #sick". Posta no Instagram uma foto da caixinha de mel com própolis com a mesma legenda. Vai ao médico, dá check-in da clínica no Foursquare, não responde quando 3 ou 4 amigos dos 673 do Facebook perguntam o que houve. Fica uns dias mal, postando cerca de cinco status por dia do tipo: "Piorei mesmo. Tá foda. #garganta #sick", ou "Preciso ficar quietinho. Não posso falar, minha garganta dói muitoooo #dor #sick". Posta selfies no Instagram na cama, deitado com olheiras, ou dos pés com a TV ligada ao fundo (e a legenda #demolho"). Falta no trabalho mas ainda responde os emails. Choraminga pra mãe, pro(a) namorado(a) e novamente no Facebook, no Twitter, no Instagram, se bobear no Pinterest e no Tumblr. Melhora, passou a vida segue - não sem antes atualizar o status dizendo "Melhorei, galera, vlw." e outro selfie, deste vez sorridente.

E é assim com tudo: viajar, ter filhos, ir ao parque, fazer ginástica, comer uma macarronada na casa da vó. Somos nossos próprios paparazzi - uns mais, outros menos - em uma exibição vazia de fatos banais da nossa vida.

É uma delícia compartilhar as coisas legais com quem a gente gosta. Eu gosto de pôr uma ou outra foto no Facebook se estou em um lugar bonito, por exemplo. Não pra mostrar "olha, eu tô aqui e vocês não", mas pra que outros possam ter acesso à mesma beleza que eu. Também é gostoso fazer rir, se divertir com o que o outro publicou, dividir opiniões, experiências, ver como o filho da amiga tá lindo, ter discussões saudáveis. É gostoso saber da vida de quem interessa pra gente, mesmo o contato direto sendo escasso. Não é?

Só que está faltando o pensar antes de publicar. Refletir um pouco. O que isso que eu vou publicar vai acrescentar na vida de quem vai ver? Por que eu quero mostrar o que estou mostrando, porque é legal ou porque eu quero me mostrar, provar alguma coisa pra alguém? Essa foto do meu almoço tem mesmo alguma coisa de diferente que faça a sua publicação valer a pena? Será que alguém está mesmo interessado no avanço detalhado da minha dor de garganta ou no pé peludo do meu namorado?

Não precisa nem pensar muito, fazer lista de prós e contras, nada disso. É coisa rápida e não dói. A vida "internética" de todo mundo melhoraria bem.


2 comentários:

  1. super.. adorei o texto e me identifico muito com o seu modo de pensar. Ps: primeira vez que comento, mas ja ha algum tempo acompanho o blog.

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  2. Sensacional. Tenho pensado muito sobre isso e vc tirou as palavras da minha boca. Ta muito complicado viver nesse mundo de oversharing.

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