Quando ela abriu os olhos viu que tinha mais brilhos e cores na cara que um carro alegórico. Não deveria ter deixado que a Claudinha a maquiasse para ir a esse bloco de rua, como chamava mesmo? Kapota Mais Num Breka. Quando se deu conta do que estava prestes a fazer, começou a pensar; ia pular carnaval num bloco com um nome desses? Não entrava nem em lanchonete que tivesse "k" substituindo algum "c" no nome. Brigou com o Paulinho quando ele quis levá-la a um "Ki-bar". E agora ia dar o ar da graça no Kapota Mais Num Breka?
Quando deu por si estava no meio da multidão pulando meio desajeitada com as amigas frenéticas, todas com as caras brilhantes e coloridas como a dela. Um batuque ensurdecedor, os gritos das amigas dando cerveja pra ela. Vira, vira, vira. Era disso mesmo que precisava para esquecer o Paulinho? Sete sombras na cara, um colar havaiano de plástico vagabundo e estranhos bêbados e suados tentando enfiar a língua na garganta dela?
Quando foi ver ela já estava até mais alegrinha e nos braços de um rapaz com nariz de palhaço, bafo de cerveja e cigarro e maconha e Halls. O beijo foi estranho, pelo que ela se lembra. Ainda bem que logo depois o moço saiu saltando ao ritmo da música, com os dedinhos pra cima e fazendo "uhuuu", encoxando uma loira logo em seguida. Ela ficou com enjoo. Paulinho jamais faria uma coisa dessas.
Vira, vira, vira, e quando ela percebeu que estava bêbada mesmo, pela primeira vez na vida aos 30 anos, começou a rir. Depois a chorar. E depois a rir de novo. Vira, vira, vira, e ela estava apoiada em duas amigas quando um mocinho recém-saído da adolescência, "fantasiado" com uma fralda e uma chupeta gigante pendurada no pescoço, começou a dançar com ela. A bebida, o calor, o batuque, os gritos, as amigas, o calor, o calor, o moço. Paulinho? Que Paulinho?
Quando se ligou já estava beijando o bebezão enquanto as amigas urravam e comemoravam. Mais enjoo. Se não fosse o moço segurando-a pela cintura, ela teria caído. Outro beijo. Que nojo. Pelo menos o bafo desse era só de cerveja. Ela queria vomitar. Paulinho.
Quando acordou estava na casa da Malu. A roupa suja de terra, de cerveja, de vômito seco, de suor. A cabeça doendo, o estômago revirado. A Malu estava dando um Engov pra ela, a Claudinha olhava com pena pra maquiagem que ela tinha feito com tanto cuidado e que agora estava destruída. Ah, e pena dela também, claro.
Quando notou que não lembrava de quase nada, ficou aflita. Dois? Como, dois? Não foi só o palhaço? Bebezão? Que bebezão? Era novinho ainda por cima? Meu Deus. Elas estavam tirando com a cara dela. Imagina o que o Paulinho ia dizer. Ah é, eles tinham terminado. Ela queria curtir a vida, ter outras experiências, era complicado namorar o mesmo cara desde os 18. Eu vomitei? Nossa, é mesmo, que cheiro horrível! Eu nem lembro. Caí? Duas vezes? Como assim, deu pra ver a minha calcinha? Muito? Mas muito quanto? Meu Deus. Se o Paulinho soubesse!
Quando viu já estava com o telefone na mão, ligando pro Paulinho. Percebeu que não queria curtir a vida coisa nenhuma, se curtir a vida era como esse Carnaval. Nem lembrar do que aconteceu ela lembrava direito. Então pra quê? Esse Carnaval só tinha servido pra ela se dar conta de que era o Paulinho mesmo que ela queria. E que jamais voltaria a pisar em qualquer coisa cheia de "k". Ah, e que ela não pode beber, mesmo.
Nadja, muito bom! Engraçado!!
ResponderExcluirAi, que nojo, carnaval é isso mesmo...
Mas confesso que ano passado, tudo que eu precisava era esquecer alguém e Carnaval me ajudou e muito! Só que não bebi assim, nem fui ao ritmo de "já beijei 1 já beijei 2 já beijei 3".
Este ano, fiquei em casa, e de novo, carnaval me fez bem mesmo assim :)
beijos!
http://nataliafornaciarig.blogspot.com/