sábado, 28 de maio de 2011

Semana da ficção - Post 3 - Vou de táxi

Entrou no táxi cansada depois de um longo e cansativo dia de trabalho. Tinha ido trabalhar com um subordinado porque o carro dela teve um "recall". Como foi a última a ir embora, não arranjou carona pra voltar. Ela praticamente se jogou no banco de trás e deu um longo suspiro antes de passar seu endereço ao motorista. Era um cansaço maior que o chefe enchendo o saco, que as 13 horas no escritório, que as três reuniões; estava cansada era da vida dela.

De trabalhar tanto, de não ter disposição pra sair de casa nos fins de semana, de quase nunca ver os amigos, de estar sozinha há tanto tempo. Se pelo menos tivesse alguém esperando por ela em casa. De preferência com uma comidinha gostosa e quentinha. De preferência pelado. Mas não.

Ela estava pensando nisso quando foi interrompida por um grito meio abafado de "GOOOOOL DO CORINTHIANS!!" Meu Deus, de onde saiu o Galvão Bueno a essa hora?? Ah, era o toque do celular do taxista. Ela achou que, além de cansada, estava ficando louca e tendo alucinações com o Galvão Bueno. E por um momentinho se irritou porque nem na alucinação aparecia homem bom pra ela. Podia ter sido o Cassio Reis, mas não, era o Galvão. Galvão, filma eu. Menos mal que não era coisa da cabeça dela. Haaaja coração.

Ignorando as leis de trânsito, o taxista atendeu o celular. Com uma voz meio de locutor de rádio do interior se fazendo de galã. Oooi, princesa.

Poxa, fazia tempo que ninguém chamava ela de princesa. Aliás, ninguém nunca tinha chamado ela de princesa. Coisa brega, né? Se bem que é bonitinho até. Que mulher não gosta de se sentir como uma princesa? Tanto é que Kate Middleton deve ser uma das mulheres mais invejadas no mundo agora, embora ainda nem seja princesa. É duquesa, né? Sei lá. Será. que o Príncipe William chama ela de duquesa em vez de princesa? "Ooooi, duquesa".

"Tudo bem, e você, gatinha? Daqui a pouco tô aí, vou só deixar uma passageira"

Uma passageira. Era isso o que ela era. Quase todos os caras que passaram pela vida dela a trataram assim mesmo, como uma passageira. Pra quem você mal olha, com quem mal conversa e que você deixa em algum lugar depois de conseguir o que quer. Que raiva. Ela era muito mais que uma passageira, isso sim. Eles que não viam isso. E o taxista também não, pelo jeito.

"Aaah o que você tá. aprontando, sua maluquinha?"

Ah peraí, agora já era um pouco demais. Ela podia ser uma passageira mas não era surda, estava ali escutando a conversa. Ele não se tocava? Daqui a pouco ia começar a falar baixaria e e ela lá, escutando tudo. Era só o que faltava.

Ele deu uma risada sacana.

Gostosa a risada dele. Ela adorava risada de homem. Se bem que as últimas que andava ouvindo eram aquelas forçadas do chefe dela rindo das piadinhas idiotas do presidente da empresa depois das intermináveis reuniões. Coisa irritante. Fazia tempo que ela não ouvia uma risada de homem assim sincera, gostosa, cheia de desejo. Que brega falar "desejo".

"Ah, não me fala essas coisas por telefone não, princesa... se não complica pro meu lado..." Outra risada.

Ela reparou no pescoço dele. Sem pêlos onde não tinha que ter pêlos. Moreno, cabelo ondulado e curto, com gel. O colarinho da camisa branca já meio sujo, meio gasto. Ombros largos, braços não tão fortes, não muito peludos. As mãos no volante, sem aliança. Era tudo muito decente nele. Viril. Pena que ela não podia ver bem o rosto, só os olhos e o nariz refletidos no retrovisor. Olhos brilhantes, olhos de quem é amado. O nariz era meio vulgar, meio grosso e redondo demais, mas não deixava de ter o seu charme.

"Não sei não se vou deixar você fazer isso comigo hoje".

Isso o quê? Isso o quê? Agora ela queria saber. Já que estava ali escutando, pelo menos que soubesse do que se trata, né? Quem sabe ela poderia dar um palpite. Ou poderia aprender algo novo pra usar quando aparecesse alguém. Ou pra usar com o próprio taxista em alguma oportunidade. Ai, que loucura! Imagina, o taxista. Que ainda por cima tinha namorada. Ou noiva. Ou era só um caso? Só uma de várias? Ou eles tinham 3 filhos?

"Ta bom, princesa, vou ter que me preparar bem então".

Princesa de novo. Carinhoso ele, né? Que bonitinho. Tá faltando homem assim. Tá faltando homem, ponto. E mais assim, carinhoso sem ser meloso e meio safado. Talvez esse fosse o ideal. Bem que ela queria um desses! E havia um ali, a centímetros de distância. Com cheiro de Glade Sport para carros. Imagina, o taxista! Ela era uma executiva viajada, estudada, importante. Bonitona até. E sozinha. Não seria tão louco assim ter um caso com o taxista. Qual o problema? Ele era carinhoso sem ser meloso e meio safado e ainda poderia levar ela pra cima e pra baixo quando ela bem quisesse, e ela nem precisaria ficar rodando pra procurar estacionamento. Ninguém ia saber. Meu Deus, ela tinha trocado meia dúzia de palavras com ele e já estava pensando em "ter um caso"? Louca.

"Então tá, daqui meia horinha mais ou menos eu tô aí. Tenho que desligar agora. Beeeeijo". Estavam a poucas quadras da casa dela. Que inveja da moça que ligou pra ele. Devia estar se preparando para receber o seu homem, o que aconteceria dali a poucos minutos. E ela se preparando para comer um miojo e ir dormir sozinha. Que merda. O coração dela se acelerou: "acho que vou fazer uma loucura. Não tenho nada a perder."

Chegaram.

Ela olhou o taxímetro e deu ao motorista o dinheiro com uma boa gorjeta incluída. "Pode ficar com o troco", ela disse. Pegou rapidamente uma caneta, arrancou uma folha do moleskine e anotou: "Ana Claudia, 4455-5519". Entregou o papel pra ele com um sorriso decidido e, com uma voz bem mais baixa e doce que o habitual, disse "e pode ficar com isso aqui também".

Ele pegou o papel, olhou e demorou alguns segundos para entender a situação. Olhou pra ela de cima a baixo e, quando os olhos deles se encontraram, ele deu um sorriso meio sem-graça mas contente.

"Tchauzinho", ela disse, fazendo um gestinho com a mão. Ele foi embora. Desde quando ela se despedia assim de alguém, falando "tchauzinho"?? Louca. Ridícula. Ela começou a rir, se sentindo uma menina que fez uma travessura. Era um sentimento gostosinho, livre. Louca. Será que ele ia ligar?

Puts, e se ele ligasse??

3 comentários:

  1. adoro os seus posts...

    e vc vai nos deixar curiosas até quando?... será que eles vão se encontrar? estou torcendo pra isso...

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  2. cara, adorei. ficcional mas com os pés no chão. "super entendo" (rs) a protagonista.

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  3. nadjuska, meu porteiro novo é GATO. simples assim, GATO. nunca vi isso no brasil. se fosse na argentina, daria até pra entender, mas aqui?!?!
    e eu sempre reparo o sorriso liiiiiiiindo que ele me dá, mas como quase sempre estou com meu namorado, tenho que engolir SECO.
    mas outro dia, eis que meu melhor amigo, com quem eu divido o apartamento e que gosta de homens, veio me falar de suas fantasias com o porteiro. e como estava com me3do de um dia chegar muito bêbado e começar a xavecar o cara. morri de rir. mas não tanto quando ele veio me contar a história de vida do porteiro: casado, ele conheceu a mulher em portugal, onde morou por alguns anos. FORTE E GOSTOSO, faz um trampo de segurança nas horas vagas. não tem filhos.
    é porteiro e, volto a dizer, É GATO!!!

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